Artigo: O inimigo do meu inimigo

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Por: Rodrigo Segantini*

Winston Churchill foi primeiro-ministro do Reino Unido durante a II Guerra Mundial. Muitos anos antes de Hitler deflagrar o conflito que causou essa chaga na história da humanidade, Churchill já dizia que a ideologia nazista era algo terrível e que exigiria atenção de todos para conter seu avanço. Isso fazia com que o governante alemão tivesse certa bronca do líder britânico. Por isso, Hitler chegou a celebrar um pacto com um adversário de Churchill, a fim de tentar garantir sucesso em sua empreitada bélica: Josef Stalin, então dirigente máximo da União Soviética.

Expoente máximo da ideologia socialista, a União Soviética era um país razoavelmente novo, já que havia sido criado no começo da década de 1920, mas já era uma potência. Governada com mão de ferro por Stalin, a URSS detinha uma vasta extensão territorial, o que lhe garantia acesso a muitos recursos naturais que poderiam sustentar a manutenção de uma máquina de guerra. Por isso, era importante tê-la como aliada no caso de um conflito. Hitler sabia disso e por isso, antes mesmo de começar as manobras que deram causa à II Guerra Mundial, tratou de garantir um pacto de paz com Stalin.

Quando Hitler invadiu a Polônia, em 01 de setembro de 1939, sabia muito bem o que estava fazendo. A Polônia tinha um tratado com a França e com o Reino Unido, de modo que um ato de agressão contra um deles seria um ato contra os três. Desta forma, a declaração de guerra da Alemanha contra a Polônia foi uma declaração de guerra também contra a França e o Reino Unido. A União Soviética aproveitou e também invadiu a Polônia, dividindo o território deste país com sua aliada Alemanha.

Hitler era um nazifascista que odiava os comunistas. Stalin era um comunista que odiava os nazifascistas. Mas ambos estavam em busca de fortalecer os estados que dirigiam e os regimes que representavam. Por isso, se toleravam. Churchill não tolerava nenhum dos dois, porque, defendendo a democracia, achava que os dois estavam errados demais para se afiliar a qualquer deles. Até que um dia Hitler achou que daria conta de invadir de surpresa a União Soviética e derrotar Stalin e seu Exército Vermelho. Foi assim que se tornaram inimigos.

Stalin pretendeu exterminar Hitler, vindo do Leste. Percebendo o propósito do líder soviético, Churchill se aliou a ele para, junto com os EUA, promover a ofensiva a partir do Oeste. Essa aliança improvável, entre americanos e britânicos com os russos, deu início ao fim da II Guerra Mundial. A Alemanha foi derrotada a partir da invasão de Berlim pelo Exército Vermelho de Stalin, o que motivou o Fuhrer a se suicidar.

Churchill não tinha nenhum apreço por Stalin e repudiava a ditadura que seu governo representava. Stalin não tinha nenhum apreço por Churchill e repudiava o sistema de governo que havia em seu país. Ainda assim, se tornaram aliados para tornarem um Mal maior, qual seja, no caso, o nazifascismo personificado em Hitler.

Esse episódio da história da humanidade trouxe à tona um antigo provérbio árabe: “o adversário do meu adversário é meu aliado” ou “o inimigo do meu inimigo é meu amigo”. Embora hoje essa expressão ser muito útil para professores de matemática ensinarem multiplicação por números negativos a alunos do ensino fundamental, ela explica de forma bastante concisa e coerente o que levou Churchill a se aliar a Stalin.

Tenho certa simpatia por Geraldo Alckmin. Nos últimos vinte anos, ele foi governador de São Paulo por quase 15 anos. Considero que ele foi um bom gestor, bastante responsável e que promoveu grandes avanços para a máquina pública do estado. Ele tentou ser candidato a presidente duas vezes: em 2006, quando Lula foi reeleito, e em 2018, quando ficou em quarto lugar e, no segundo turno, Bolsonaro derrotou Fernando Haddad. Durante o tempo em que foi o governador de São Paulo e quando foi candidato a presidente, sofreu com a oposição do PT, liderado por Lula e Haddad. Porém, hoje, Alckmin é candidato a vice de Lula e é o principal opositor da campanha pela reeleição do presidente Jair Bolsonaro.

Percebendo que não tinha chance de derrotar a ameaça que Hitler e o nazifascismo representava, Winston Churchill, reconhecido pela história como um dos maiores líderes políticos da história da humanidade, aceitou se aliar com Josef Stalin, tido como um dos maiores e sanguinários ditadores que o mundo já viu. Quando ouço alguém tripudiar de Alckmin por hoje se aliar a Lula contra Jair Bolsonaro, quando vejo falas pronunciadas por Alckmin no passado a respeito dos políticos petistas serem rememorados para pôr à prova sua postura hoje em dia, consigo entender o dilema de Churchill naqueles idos da década de 1940. Naquela época, deu certo. Tomara que dê certo de novo, desta vez por aqui. Vendo a sombra se aproximar, é preciso acender a luz para afugentá-la.

*Rodrigo Segantini é advogado, professor universitário, mestre em psicologia pela Famerp.

**Os artigos publicados com assinatura não manifestam a opinião de O Defensor. A publicação corresponde ao propósito de estimular o debate dos problemas municipais, estaduais, nacionais e mundiais e de refletir as distintas tendências do pensamento contemporâneo.

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